segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Concausas

Segundo o professor Eudes Quintino de Oliveira Junior a CONCAUSA é um concurso de fatores (preexistentes, concomitantes ou supervenientes) que, paralelamente ao comportamento do agente, são capazes de modificar o curso natural do resultado. Ou seja, são fatores externos à vontade do agente, mas que se unem a sua conduta. Assim, têm-se duas causas: a do agente e esses fatores que com a dele convergem. Desta feita, em relação a esses fatores, pode-se afirmar que existem duas modalidades de causas: as dependentes e as independentes. Neste espaço, pretende-se discutir apenas acerca das últimas, por terem maior relevância e complexidade.

Cumpre então destacar que as causas independentes, isto é, aquelas cujo aparecimento não é desejado e nem previsto pelo agente e produzem por si só o resultado, são divididas em duas: (a) as absolutamente independentes e (b) as relativamente independentes, a depender da sua origem.

As absolutamente independentes não possuem qualquer vínculo com a conduta do agente, ou seja, possuem uma origem totalmente divorciada da conduta delitiva e ocorreriam ainda que o agente jamais tivesse agido. Por isso, trazem uma solução mais simples e não podem, jamais, ser confundidas pelo intérprete, até porque seus exemplos são clássicos e trazidos pela mais ampla doutrina. Possuem três modalidades, a saber:

1] Preexistente: é a causa que existe anteriormente à conduta do agente. Ex: “A” deseja matar a vítima “B” e para tanto a espanca, atingindo-a em diversas regiões vitais. A vítima é socorrida, mas vem a falecer. O laudo necroscópico, no entanto, evidencia como causa mortis envenenamento anterior, causado por “C”, cujo veneno ministrado demorou mais de 10 horas para fazer efeito[1];

2] Concomitante: é a causa que surge no mesmo instante em que o agente realiza a conduta. Ex: “A” efetua disparos de arma de fogo contra “B”, que vem a falecer em razão de um súbito colapso cardíaco (cuidado, não se trata de doença cardíaca preexistente, mas sim de um colapso ocorrido no mesmo instante da conduta do agente!);

3] Superveniente: é a causa que atua após a conduta do agente. “A” administra dose letal de veneno para “B”. Enquanto este último ainda está vivo, desprende-se um lustre da casa, que acaba por acertar qualquer região vital de “B” e vem a ser sua causa mortis.

Assim sendo, percebe-se que nos três itens acima citados o resultado naturalístico ocorreu de maneira totalmente independente da conduta do agente e que as causas atuaram de forma independente foram responsáveis pela produção do resultado. Então, por não haver relação de causalidade (nexo causal) entre resultado e conduta do agente, este responde apenas pelos atos já praticados, isto é, por tentativa de homicídio, desde que comprovado o animus necandi.

Conclui-se, assim, que nas causas absolutamente independentes (quaisquer de suas modalidades – preexistentes, concomitantes ou supervenientes) o agente responderá somente pelos atos já praticados, mas jamais pelo resultado, ante a falta de relação de causalidade.Aplica-se, então, a Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais (conditio sine qua non), prevista no artigo 13, caput, CP.

Já as causas relativamente independentes, por sua vez, têm origem na conduta do agente e, por isso, são relativas: dependem da atuação do agente para existir. Também possuem três modalidades:

1] Preexistente: a causa existe antes da prática da conduta, embora seja dela dependente. O clássico exemplo é o agente que dispara arma de fogo contra a vítima, causando-lhe ferimentos não fatais. Porém, ela vem a falecer em virtude do agravamento das lesões pela hemofilia.

2] Concomitante: ocorre simultaneamente à conduta do agente. Outro clássico exemplo é o do agente que dispara arma de fogo contra a vítima, que foge correndo em via pública e morre atropelada por algum veículo que ali trafegava.


Nessas duas hipóteses, por expressa previsão legal (art. 13, caput, CP), aplica-se a teoria da equivalência dos antecedentes causais e o agente responde pelo resultado naturalístico, já que se suprimindo mentalmente sua conduta, o crime não teria ocorrido como e quando ocorreu. Assim, responde por homicídio consumado.
A grande e essencial diferença aparece na terceira causa relativamente independente:

3] Superveniente: aquela que ocorre posteriormente à conduta do agente. Neste específico caso, torna-se necessário fazer uma distinção, em virtude do comando expresso ao artigo 13, §1º, CP: A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

Ora, da simples leitura deste artigo, depreende-se que existem as causas relativamente independentes que, por si só, excluem o resultado e as que não excluem. Sendo assim, novamente pelo expresso comando legislativo, apenas as que produzem por si só o resultado naturalístico terão tratamento diverso.

PARA RESUMIR:

1) Causa Superveniente Relativamente Independente que não produz por si só o resultado: aplica-se a teoria da conditio sine qua non – regra geral – por não se enquadrar na exceção do §1º do artigo 13. Como exemplo clássico, tem-se a vítima que é alvejada por disparos não fatais, mas vem a falecer em virtude de imperícia médica na oportunidade da cirurgia a qual teve que ser submetida em virtude dos ferimentos. Resta claro que a imperícia médica não mata qualquer pessoa, mas somente aquela que enseja a intervenção médica. Como a lei manda aplicar a teoria da equivalência dos antecedentes, constata-se que a vítima somente faleceu em virtude da intervenção cirúrgica necessária em razão dos ferimentos causados por disparos de arma de fogo (suprimindo-se os disparos, a cirurgia não seria necessária e, portanto, temos a causa do homicídio). Logo, neste caso, o agente responde por homicídio consumado.

2) Causa Superveniente Relativamente Independente que produz por si só o resultado: é a situação excepcional, que se amolda ao artigo 13, §1º, CP. Aqui, aplica-se a teoria da Causalidade Adequada e temos como exemplo a vítima que é atingida por disparos de arma de fogo não fatais, mas vem a falecer em virtude do acidente automobilístico de sua ambulância e a vítima que, também alvejada, vem a falecer em razão de um incêndio na ala de feridos do hospital.

Neste preciso ponto, demanda-se máxima atenção do estudioso do Direito Penal. Caso houvesse apenas o caput do artigo 13, CP, nesse último item teríamos a imputação de homicídio consumado ao agente, vez que, pela teoria da equivalência dos antecedentes, sua conduta é causa do homicídio.

Destarte, a lei não contém palavras inúteis e a previsão do §1º, artigo 13, tem sua razão de existir. Por expressa determinação, deve-se aplicar a teoria da Causalidade Adequada nos casos do item 2 supra, o que enseja entendimento diverso.

Por essa teoria, entende-se como causa uma contribuição adequada do agente. Assim, naqueles exemplos da ambulância e do hospital em chamas, qualquer pessoa que ali estivesse fatalmente iria morrer e não apenas a vítima alvejada por disparos. Como o disparo não fatal não é adequado para configuração do homicídio, o resultado naturalístico morte (em razão do acidente ou do incêndio) não pode ser imputado ao agente. Por isso, nestes casos do item 2, o agente responde por homicídio tentado.

Percebe-se, deste modo, a grande diferença. Nosso Código Penal determina em quais situações deve o intérprete se valer da regra geral (conditio sine qua non) e em quais situações se valer da exceção (causalidade adequada). Assim, a imputação ao agente é completamente distinta, a depender da teoria aplicada.

Portanto, recomenda-se demasiada atenção para caracterizar qual modalidade de concausa incide no caso concreto, para optar pela teoria correspondente e, assim, atribuir o resultado naturalístico ao agente. Mesmo com tal zelo, não se pode perder de vista que a diferenciação decorre única e exclusivamente do comando legal.

Matéria completa disponível em:

Nenhum comentário:

Postar um comentário